A publicação deste Direito de Resposta da diretora da Escola Secundária Poeta Al Berto, Paula Melo Lopes, ao artigo de opinião “Escola Poeta Al Berto expõe alunos de 11 anos a pornografia” de Maria Helena Costa é feita ao abrigo da Lei de Imprensa.
“Ao ataque grosseiro que Maria Helena Costa dirigiu à Escola Secundária Poeta Al Berto e aos seus profissionais nas redes sociais não respondemos. Na condição de educadores de uma escola pública, que defendemos, e em respeito pela comunidade educativa, que servimos, obrigamo-nos a não abandonar o campo da argumentação racional, rejeitando fazer parte do espetáculo de violência verbal montado para agradar a um certo público, sempre pronto a ofender-se com os legítimos direitos e liberdades dos outros. Mas o espetáculo, disfarçado de opinião, transferiu-se para as páginas do Observador, na crónica do dia 11 de maio, intitulada “Escola Poeta Al Berto expõe alunos de 11 anos a pornografia”, e agora cumpre-nos denunciá-lo, ao abrigo do direito de resposta. Não porque a reputação desta instituição ou dos seus profissionais dependa dos ataques ad hominem da autora, mas porque nos recusamos a servir de instrumento desta sua cruzada particular. Na interpretação mais benigna, em que se admite que MHC possa representar uma certa sensibilidade social, isso não lhe dá o direito de deturpar os factos à medida dos seus preconceitos nem legitimidade para elevar esses mesmos preconceitos à categoria de verdades morais absolutas. Muito menos a autoriza a transformá-los em factos científicos objetivos.
Os Factos
- Existe uma Escola Secundária Poeta Al Berto, em Sines.
- Não há alunos com 11 anos nesta escola.
- Existiu uma exposição sobre sexualidade, que esteve em exibição de 22 de abril a 5 de junho. Esta exposição é periódica (acontece normalmente de 3 em 3 anos) e faz parte das ações de Educação Sexual (ES) em meio escolar.
- A semelhança dos outros anos, a ES está integrada na área da educação para a saúde e é dinamizada em termos curriculares (nas várias disciplinas), numa ótica transversal, rentabilizada em Cidadania e Desenvolvimento, e complementada com atividades promovidas pelo gabinete de educação para a saúde (em articulação com o Serviço de Psicologia, o Centro de Saúde Local, no âmbito do protocolo entre os dois ministérios, e outras entidades), de acordo com o estipulado na legislação em vigor (1)(2), e integra o Projeto Educativo da escola, documento que resultou da reflexão e discussão de todos os intervenientes no processo educativo, nomeadamente pais e Encarregados de Educação.
. A Educação para a Saúde, em que a ES está inserida, é coordenada por um F. A., mas também é dinamizada por L.R., S.B., C.A., e poder-se-á continuar até ao número de palavras determinada para este artigo de resposta, pois a maior parte dos professores desta escola envolve-se diariamente na ES, e fá-lo há quase trinta anos. A escola tem vários professores com formação específica na área, inclusive formação académica avançada, e já foi várias vezes convidada e selecionada para colaborar em estudos científicos (ex. HBSC da OMS, e ESABE da DGE e FMH).
- A ES em meio escolar tem caráter obrigatório e destina-se a todos os alunos que frequentam estabelecimentos de ensino básico e secundário da rede pública e os estabelecimentos da rede privada e cooperativa com contratos de associação, do território nacional. Segundo os normativos legais referidos, a informação sobre sexualidade é essencial na educação para a saúde. Mas também identifica claramente os valores a transmitir: a sexualidade é entendida dentro do domínio relacional, a dois, valorizando a afetividade, o respeito e os direitos humanos, no geral, como a igualdade (de direitos e deveres) entre homens e mulheres, o direito à diferença (entre indivíduos) e a inclusão. Pretende desenvolver as competências dos jovens para que possam fazer escolhas informadas e seguras e assim reduzir comportamentos de risco e promover comportamentos seguros. Pretende que se desenvolvam equilibrados e seguros e, portanto, mais felizes. Assim, com vista a uma vida saudável em sociedade, os jovens devem adquirir conhecimentos e desenvolver atitudes e comportamentos nesta área.
- Não houve qualquer aluno, pai ou (outro) membro da comunidade que tivesse feito chegar qualquer comentário negativo, oralmente ou por escrito, à direção da escola. Vários pais manifestaram interesse, apoio, solidariedade, elogiando não só a referida exposição, mas a ES desenvolvida pela escola, particularmente na sequência do artigo de MHC nesse jornal.
- Os Pais e os alunos participam e são ouvidos nos vários momentos da ES: na reunião inicial com Diretores de Turma em Setembro, os Pais são informados da existência de um gabinete de Educação para a Saúde, na reunião intercala em outubro (que conta com a participação dos representantes dos Pais e de alunos) é elaborado o Projeto de Educação Sexual de cada turma, e nas restantes reuniões ao longo do ano vão sendo informados acerca do estado de desenvolvimento da ES. O Projeto Educativo (documento orientador da escola, que define os procedimentos pelos quais pais e alunos participam na implementação da ES) e o Plano Anual de Atividades (que integra atividades complementares da ES) são analisados, aprovados e avaliados em Conselho Geral, órgão máximo das escolas em que estão representados os vários corpos da comunidade educativa, incluindo Pais e alunos. Para além disto, as turmas ainda têm oportunidade de expressar o que pensam e sentem sobre o assunto ao longo do ano.
A perceção dos factos
Uma coisa são os factos, portanto, e outra a perceção dos factos. MHC não viu a exposição e não sabe de que modo foi abordada com os alunos (de várias idades). Nem precisa. Independentemente dos factos, constrói a sua perceção, que é basicamente um conjunto de reações subjetivas a imagens e materiais que fazem parte da exposição, mas são descontextualizados, e a outros que não estão, mas que MHC faz questão de apresentar, porque isso lhe permite intensificar o tom emocional do discurso. Capas de livros com conteúdo sociológico, científico, artístico; peças de arte; imagens de obras de arte; um espermatozóide; preservativos e a imagem gráfica de como se colocam; fotografias de um homem e uma mulher, de dois homens e de duas mulheres a beijarem-se. Tudo igualmente chocante, escandaloso; potencialmente pornográfico, ideologia de género ou então ativismo LGBT, a ponto de não se perceber bem em que momento se atinge o climax da indignação nem com base em que critérios se aplica cada uma dessas etiquetas.
MHC tem direito a expressar a sua sensibilidade relativamente ao tema. Mas não vamos confundir nem crianças nem adultos. Os conteúdos da exposição não são pornográficos. MHC é que vê pornografia neles. É a S-U-A percepção. E é ideologicamente enviesada. Para quem trabalha nas escolas com adolescentes, este género de discurso é pura distração da realidade.
Apercebemo-nos do risco crescente da exposição de crianças e jovens à pornografia; conteúdos que associam o sexo com a violência, a dominação e objetivação do outro. Porém, é nas redes sociais e nas plataformas digitais que essa exposição acontece. Basta ler o Relatório Anual de Segurança Interna e as notícias dos últimos meses para concluir que há melhor uso a dar ao termo pornografia é a capacidade de indignação. Revenge Porn no Telegram: o canal de misoginia assistido por 70.000 homens; Jovens que usam os canais digitais para cometer crimes de pornografia de menores, incitamento à violência sexual, abuso sexual de crianças e violações, ou que seguem influenciadores que os cometem, são só alguns exemplos. Há uma subcultura da violência sexual que está a ganhar adeptos entre os jovens. Atacar a escola pública por informar, promover a compreensão da sexualidade nas suas múltiplas dimensões (biológica; psicológica; relacional e afetiva) e debater questões tão urgentes como o consentimento nas relações é tão descabido como destruir a vacina para combater a epidemia.
Todos diferentes, todos iguais
O lema não é, obviamente, uma invenção desta escola nem se aplica exclusivamente aos conteúdos da exposição. Do ponto vista do que é essencial para a convivência, a valorização do desempenho ou do comportamento de qualquer elemento da comunidade educativa, a orientação sexual ou a identidade de género são moralmente irrelevantes, tanto quanto a religião, a origem, a etnia ou quaisquer outras características individuais ou grupais. Este é, aliás, um princípio agregador e transversal a pessoas de todos os credos políticos ou religiosos. Sem este denominador comum, o espaço social transforma-se numa batalha campal. Não esperávamos ter de explicar a MHC que, sim, pessoas que são diferentes dela e que não se ajustam aos seus preconceitos continuam a ser iguais a ela em dignidade e em direitos. Não cabe ao Estado regular a vida sexual dos cidadãos, mas compete-lhe garantir que não são discriminados por causa dela.
(1) Lei n.º 60/2009, de 6 de Agosto (Estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar.)
(2) Portaria n.º 196-A/2010, de 9 de Abril (Procede à regulamentação da Lei n.º 60/2009, de 6 de Agosto.)
Paula Maria Daniel de Melo Lopes,
11 de junho de 2025″